sexta-feira, 12 de dezembro de 2014

Crítica: Boyhood – Da Infância à Juventude

Em determinado momento do filme, Mason pergunta para seu pai Mason Sr:

“- Então, de que adianta?
- O quê?
- Não sei...tudo.
- Tudo ?! (responde seu pai, Mason Sr)....não faço ideia....ninguém sabe.......estamos só vivendo, sabe? “



Esse belo e magnífico filme escrito e dirigido por Richard Linklater (trilogia “Antes do Amanhecer “ e “Escola de Rock”) já está consolidado como um dos melhores filmes da década.
Original desde sua concepção, “Boyhood – Da Infância à Juventude” conta a história de Mason dos 6 aos 18 anos, sua trajetória da escola até a faculdade, porém, com os mesmos atores. O filme começou a ser rodado em 2002 e teve suas últimas cenas gravadas somente em 2013.
O filme foi gravado da seguinte forma, Linklater reunia o elenco, uma vez por ano, por uma semana, e gravava parte da história. Os atores foram envelhecendo como e com seus personagens, e acompanhar essas mudanças, físicas, comportamentais e psicológicas de Mason (Ellar Coltrane), sua irmã mais velha Samantha (Lorelei Linklater), sua mãe Olivia (Patricia Arquette) e de seu pai Mason Sr (Ethan Halke) em 2hs e 45 min de filme é bastante prazeroso e emocionante.
Um roteiro que certamente foi se moldando com o passar dos anos, mas que em momento algum fugiu do que foi proposto desde o início que era contar a história de uma criança, passando pela adolescência até se tornar adulto. Linklater acerta nos diálogos e na dinâmica dos acontecimentos relatados. O roteiro, bem elaborado e perfeito para a história que o diretor quer contar, não necessita de viradas mirabolantes e grandes segredos, e sim, sua simplicidade e fluidez são à base do filme.
Patricia Arquette está fabulosa em cena e sua mudança física (dos 32 para os 44 anos) é realçada por uma bela performance, que possivelmente renderá uma indicação ao Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante. É interessante notar também as mudanças no corte de cabelo e nas roupas de sua personagem, que deixa claro ao expectador a evolução de Olívia como mãe e profissional (de estudante á professora Universitária).
Ethan Halke consolida-se como um dos melhores atores de sua geração e possivelmente será indicado ao Oscar de Melhor Ator Coadjuvante por seu personagem em “Boyhood”. Da mesma forma que Olivia, acompanhar as mudanças e a evolução de Mason Sr é bastante interessante. Ethan consegue dar ao personagem uma faceta de “eterno adolescente”, um pai que demora a se tornar adulto e responsável, o que pode ser notado por suas roupas (quase juvenis) sempre num tom escuro e pelo carro que possui, que se repete com os primeiros anos, contrastando com a evolução dos outros personagens.
Mas é a personalidade de Mason e a sua evolução dos 6 aos 18 anos que realmente é o fio condutor do filme. Ellar Coltrane foi peça fundamental de um projeto sem precedentes na história de Hollywood e somente por isso o jovem ator já ficará marcado. Com todas as mudanças físicas do ator (principalmente em relação a sua voz), é impressionante ver que a personalidade de Mason, bondoso, inteligente, sensível, é a mesma dos 6 aos 18 anos, o que pode ser comprovado pelo mesmo tom de voz e pela postura (ombros quase sempre curvados) mostrando vulnerabilidade e timidez.

A direção de Linklater é primorosa. Todas as passagens de tempo, 10 no total, são feitas de forma orgânica. O expectador consegue identificar os “saltos no tempo” sem necessitar de uma legenda dizendo: “1 ano depois...”. Chamo a atenção para as cenas que precedem os “saltos no tempo de 1 ano”, elas variavelmente trazem alguma informação que será importante para o ano seguinte, mas nada expositivo, são referências como um diálogo que Mason está ouvindo ou uma troca de olhares entre determinados personagens, pequenos detalhes.
Linklater mostra parte da perfeição de sua direção numa cena em que Mason e sua namorada, Sheena, estão conversando sentados á mesa de uma lanchonete. O assunto em questão é a fragilidade das relações e o quanto as redes sociais (Facebook) estão prejudicando amizades, namoros, etc. Mason e Sheena começam o assunto dentro do carro, algumas cenas antes, com Sheena defendendo o “Facebook” e Mason afirmando que as pessoas estão cada vez mais distantes umas das outras, então ele começa a fazer monólogo, curto, mas um monólogo. Sheena não o interrompe em momento algum e quando ele termina a câmera muda de posição (na diagonal das costas de Sheena, pegando a mesa e Mason de frente), então a última coisa que Sheena faz é olhar seu Smartphone. A cena em que Sheena “olha o Smartphone” é muito rápida, porém, isso já basta para o que virá depois.

Mas o filme é sobre o quê?

Cada pessoa que assistir terá seu ponto de vista, o meu é: vida.
O diálogo do início do texto é de uma conversa entre pai e filho, onde o jovem questiona “o que adianta isso tudo?” (relacionamentos, amores, estudos, trabalho, etc) e o pai responde que “não sabe”. “Boyhood” não tem a pretensão de responder “qual o sentido da vida”, não é isso, mas sim mostrar que a vida tem, e terá momentos difíceis, chatos, emocionantes, belos, entediantes, etc, e que o melhor que podemos fazer é administrar nosso tempo e aproveita-lo para as coisas que realmente importam.  


Digo sem medo que “Boyhood – Da Infância à Juventude” é o melhor filme de 2014 e um dos melhores filmes que vi em toda minha vida. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário